quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Capitulo 1 - Elyon



Era um dia melancólico.
O céu estava nublado com nuvens escuras, e estava começando a garoar.
Fazia quinze minutos que eu estava segurando fortemente o meu gigante livro das sombras e minha pesada bolsa de mão em um dos braços, enquanto o outro se esforçava para manter-se agarrado ao banco do flex boat que dava pequenos e repetidos saltos sobre a água do mar.
O velho que estava me conduzindo para Elyon definitivamente estava se divertindo com o meu estado lastimável, eu vi um sorrisinho manifestar-se quanto eu me choquei com a lateral do bote e meu livro voou da minha mão.
Ele me ajudou a resgatar o livro que foi parar do outro lado, e antes de me entregar ele olhou com um certo receio  por alguns segundos para a parte exterior preta com um símbolo abstrato em dourado no centro
-‘’Menina... Você faz parte de algum culto do diabo?’’ - Ele perguntou apreensivo, como se julgasse a pergunta perigosa.
‘’Culto do diabo?’’ - Eu fiz careta, tentando entender o porque da pergunta.
‘’Você sabe...  O livro, essa roupa...’’ - Ele apontou para minha capa que estava esvoaçando naquela momento.
Embora sua face tivesse relaxado, eu sabia que alguma parte do senhor acreditava piamente que eu era do mal
- ‘’Esse lugar para onde eu estou te levando não é algum tipo de templo de adoração ao satã não... é?’’ - Ele perguntou com uma pontada de desconfiança, ainda tentando manter a expressão brincalhona no rosto.
Não pude conter o riso.
Aquele era o tipo de pensamento que a capa preta com toca grande que os elyanos erroneamente chamavam de uniforme produzia nas pessoas, lembrava muito aqueles fanáticos de seita satânica, embora fosse apenas um casaco de tecido impermeável usado como proteção contra a chuva, os meus ancestrais usavam isso séculos atrás, e por algum motivo em pleno século XX1 as nossas vestimentas não mudaram.
‘’Não’’ - Respondi rindo -‘’Isso aqui é apenas... Uma piada interna’’
Ele pareceu pensar em que tipo de piada interna aquilo poderia se tratar
Nós ficamos em silêncio.
O senhor acelerou mais ainda e depois começou a fazer uma espécie de zigue-zague com o bote.
‘’Você pode ir mais devagar?’’ - A minha pergunta se perdeu em meio ao barulho do motor e da água do mar batendo nas laterais - ‘’É sério moço’’ - Eu tentei dizer mais alto - ‘’Eu vou passar mal’’
Eu não sei se ele não havia me escutado ou se apenas resolveu me ignorar, só sei que estávamos cada vez mais acelerados, eu me sentindo nauseada e o senhor se divertindo como um molecão.
‘’Terra a vista madame’’ - O velho condutor disse zombeteiro assumindo uma expressão alegre.
Alivio me inundou quando eu vi ao longe a pequena ponta de terra que gradativamente se elevava a cima da água enquanto nos aproximávamos. A ponta de terra foi tomando forma, até que se tornou um abrigo para os botes.
O senhor cujo nome eu não lembrava, acostou o flex boat na margem empedrada do cais, ao lado de dezenas de outros botes que eram pretos com os toldos vermelhos e estavam alinhados ao lado da passagem de madeira elevada para pedestres.
‘’Chegamos’’ - Ele disse com uma expressão satisfeita quando depois de muito sacrifício ajeitou o bote no meio de outros dois.
‘’Obrigado’’ - Não era bem o que eu deveria dizer, não depois das manobras radicais e do aumento de velocidade proposital.
‘’Disponha’’ - Ele disse enquanto prendia o bote.
Foi custoso ficar de pé, a carga de adrenalina ainda corria pelas minhas veias e meus batimentos cardíacos estavam em um ritmo intenso, o que fez minhas pernas ficarem bambas dificultando minha estabilização no chão.
‘’Aqui’’ - O velho estendeu a mão para me ajudar a ficar de pé no cais -
‘’Você esta entregue’’ - Ele disse enquanto investigava o ambiente com os olhos atentos a procura de alguma anormalidade - ‘’Bem... Me parece um lugar normal’’ - Ele concluiu
Aquilo não era verdade. Elyon não era normal.
‘’Bom se você não vai mais precisar de mim eu vou voltar para cidade’’
Atordoada demais para responder alguma coisa eu apenas balancei a cabeça em expressão de despedida.
‘’Se cuida menina’’ - Foi a ultima coisa que ele disse antes de ganhar distância da ilha.

E lá estava eu, com a minha capa sinistra que flutuava ao vento forte observando as ondas baterem furiosamente nas pedras, tentando juntar força e energia moral para afrontar o que quer que eu encontrasse quando passasse aqueles enormes muros que estavam alguns metros depois do final do cais.
Eu estava nervosa, e insegura, nunca na minha vida tinha estudado com imortais, sempre em colégio para jovens mulheres especificamente humanas. Sempre me senti mais humana do que bruxa, pelo menos até o ponto em que eu não explodia e incendiava coisas involuntariamente.
Agora eu não tinha mais escapatória, pois havia chegado a um ponto critico em que meus poderes desenfreados estavam me causando sérios problemas, e eu sabia, por mais que quisesse negar que eu precisava urgentemente de treinamento.
A primeira coisa que eu vi ao adentrar foi uma construção de metal e vidro muito alta que me lembrava a torre de controle de um aeroporto, aquelas que transmitem ordens de levantar vôo e aterrissagem, o que aquilo era de fato eu não sei, só sei que era suntuoso e prendeu minha atenção por um bom tempo.
A próxima coisa que vi ao passar o formosa construção foi o que estava marcado no meu mapinha como pátio principal.
Tinha uma fonte no centro e árvores ornamental ao redor, e atrás um gigante arco gótico que marcava a entrada dos prédios.
Depois da arca havia um caminho de pedra que conduzia direto a entrada dos dormitórios onde havia uma aglomeração de pessoas que assim como eu estavam chegando.
Por força de habito eu segurei a respiração. Eu não sabia o porque mais me sentia em território hostil.
Havia vários grupos espalhado por todos os lados. Grupos de vampiros e grupos de bruxos, nenhum grupo de bruxos e vampiros sequer.
Como eu descobri isso?
Simples.
Os uniformes eram diferentes!
Eu soltei minha respiração.
O que aconteceu com todo aquele discurso de socialização de espécies, os benefícios da irmandade e mais todos aqueles blábláblás sobre formar uma sociedade, que eu cresci escutando da minha família?
 Vampiros estavam usando uniformes consideravelmente melhores que o dos bruxos, nada de capa para eles mais sim terno e gravata para meninos e saia e blusa para as meninas, a única coisa de semelhante entre o uniforme das espécies era o brasão da águia com duas cabeças. Não havia nada de socialização naquele lugar, e pelo jeito que eles se ignoravam aquela parecia uma coisa utópica de se acontecer.
Eu estava parada no meio da entrada dos dormitórios perdida em meus pits internos quando um badalar agudo de um sino me tirou bruscamente do meu devaneio. A multidão foi aos poucos se dissipando para direções opostas, todos pareciam saber para onde ir, menos eu. Aquele era o típico misto entre comédia e tragédia do primeiro dia de aula. A sensação de estar perdido e desalento é sempre a mesma no primeiro dia.
Eles usavam um sino como indicador ao invés de um simples alarme, um pouco atrasado para pessoas que julgam seu desenvolvimento mental superior aos demais.
Mesmo com um mapa do internato eu tive dificuldade de encontrar a torre sul, se fosse em uma escola normal eu até me atreveria a pedir informação, mais Elyon era tudo menos uma escola normal e os alunos pareciam tão... Intimidadores, todos eles em posturas dignas de aristocratas.
Eu perdi as contas de quantas voltas eu dei. Eu estava indo em direção a torre norte onde estava localizada a ala masculina, e se não fosse aquele ser fofo e de bom coração me ajudar eu teria cometido minha primeira gafe em tempo recorde.

‘’Por aqui’’ - O bruxo de cabelos vermelho combinando com o meu apontou quando eu disse que estava perdida - ‘’Eu te mostro o caminho’’
Ele era um autentico cavalheiro, até sua postura indicava isso, sua coluna se erguia numa linha reta, perfeita, sem curva. Obviamente não havia nascido no século XX1, deduzi isso quando ele se ofereceu para levar minha bolsa e meu livro. Eu podia ver claramente a imagem dele salvando donzelas em apuros.
‘’É só marcar a partir desses três pilares... ’’ - Ele apontou para as três colunas estilo casa branca - ‘’Para a esquerda torre norte, o lugar aonde você definitivamente não quer ir’’ - Ele sorriu - ‘’A não ser que você queira problemas, ai seria o lugar certo’’ - Ele disse problemas com certa malicia - ‘’E a torre sul para a direita’’
Eu olhei para a direita onde supostamente deveria estar à torre sul.
‘’Você tem que andar um pouco, uns cinco minutos eu acho’’
‘’Muito obrigado’’ - Eu sorri, mais no fundo estava praguejando por Elyon ter um absurdo de passagens e divisões dispostas confusamente.
Ele estava com uma expressão de amabilidade e simpatia, me dava vontade de apertar as bochechas dele.
Minha irmã Bluma havia me dito diversas vezes antes de eu sair de casa, que em Elyon as aparências enganavam, e que uma pessoa de inocência franca como eu, deveriam tomar cuidado. Tudo bem que não foi bem inocência franca o que ela disse, foi uma coisa meio grosseira, mais de qualquer jeito entrou bem na minha cabeça. E eu me peguei perguntando se o bruxo fofo era realmente fofo, ou se era só a mascara como disse Bluma.
‘’Então é melhor eu ir’’ - Eu finalmente disse
‘’Ah, ok... Nos vemos depois’’ - Ele deu um sorriso caloroso.

E ele foi o meu primeiro contato em Elyon, e não havia me tratado com indiferença, talvez eu tivesse uma imagem equivocada dos imortais, talvez eles não fossem tão esnobes quanto Bluma havia me dito e... - Droga, de novo, meu subconsciente estava reproduzindo o a lavagem cerebral contra Elyon da minha irmã. Talvez aquilo fosse exatamente o que ela queria, que as palavras dela influenciassem minha vida.
Tomei uma golada de ar
E assim com a mente aberta e receptiva eu me dirigi à torre sul.
Sem pré conceitos Diana, Sem pré conceitos - Eu repetia debilmente pra mim mesma

’Você esta atrasada querida’’ - Uma menina branquela mais ou menos da minha idade disse num tom irritado quebrando o meu mantra - ‘’O sino bateu faz tempo, você não escutou?’’
Aquela era a inspetora da Ala Sul? Eu esperava alguém mais... Velha.
‘’Uh, na verdade eu me perdi’’
‘’Se perdeu é?’’ - Ela disse desagradavelmente enquanto enrolava uma mecha rocha de cabelo nos dedos
Eu assenti meio colérica.
‘’Nome’’ - Ela mascava chiclete estrondosamente com boca aberta
‘’Diana’’
Ela me olhou por cima dos óculos - ‘’Diana do que querida?’’
‘’Diana Salonen’’
A garota pareceu me notar pela primeira vez, me analisou dos pés a cabeça e depois checou uma lista
‘’Terceiro andar, cento e vinte e um’’ - A vampira roqueira mau-humorada disse desgostosa - ‘’Só pra você saber aqui nós não fazemos distinções querida, pontualidade é uma coisa que prezamos muito aqui em Elyon, só vou te dar um desconto porque ainda estou com espírito de solstício de inverno’’
Eu deveria ter ficado brava por ela estar sendo grossa comigo sem motivo, mais eu não consegui, o jeito enjoado ao extremo dela, fez-me rir, era simplesmente cômico.
Eu nunca imaginei que eu fosse encontrar uma vampira roqueira

 Antes de eu bater na porta eu só pude desejar que o destino me colocasse com colegas de quarto decentes, em quesito de dormitórios eu só me ferrava.
Eu levantei a mão pra bater na porta, mais eu fui em seco porque alguém já a tinha aberto, era uma bruxa de longos cabelos negros baixinha e cheia de sardas.
‘’Sim esse é o seu quarto ‘’- A baixinha disse me surpreendendo - ‘’Entre!‘’- Ela deu um sorriso amigável que a deixou com cara de piveta.
Eu atravessei a porta surpreendida.
‘’Prazer, eu sou... - ‘’Eu ia dizer meu nome quando a baixinha respondeu por mim.
‘’Diana eu sei‘’ - Ela esticou a mão pra me cumprimentar e logo disse seu nome - ‘’Aislin‘’
Uma bruxa vidente como colega de quarto? Não poderia ser um tanto problemático? Quer dizer, não é como se eu pudesse esconder algum segredo dela.
Eu joguei meu gigante livro e minha bolsa de mão na macia e convidativa cama do meio, ela estava forrada com uma colcha de seda preta, minhas malas e pertences que eu havia despachado alguns dias antes estavam ao lado, eu me sentei e comecei a observar o luxuoso quarto com carpete de madeira perfeitamente lustrado, as paredes em cor creme com bordas de gesso num estilo clássico, três camas box, e criados mudos em cada lado esquerdo das camas, e o mais notável, um lustre enorme em forma de caracol no centro. Eu tinha que admitir Elyon tinha superado as minhas baixas expectativas.
‘’Você pode ficar com essa parte‘’ -Ainslin abriu o closet alguns minutos depois me tirando dos meus devaneios, ela apontou pra um espaço que provavelmente não caberia nem metade dos meus sapatos.
‘’Não brinca‘’ -Eu avaliei com desanimo o pequeno espaço.
‘’Reclame com a vampira espaçosa‘’ -Aislin disse em um tom meio irritado.
‘’A outra garota é uma vampira? ‘’ -Eu perguntei só um pouco excitada pelo o fato de pela primeira vez conviver de perto com um sugador
Aislin balançou a cabeça que sim com desanimo. - ‘’Ela descarregou as bugigangas dela primeiro que nós.‘’
‘’Percebi‘’ -Eu disse quando avistei a parte do canto obviamente pertencente à vampira, a portinha nem fechava direito.
Eu me levantei pra começar arrumar as coisas que dessem no misero espaço do imenso closet, eu não ia reclamar, não no primeiro dia pelo menos. 
‘’Porque nossos uniformes são diferentes do dos vampiros? ‘’ Eu perguntei enquanto pendurava roupas no cabide a fim de quebrar os quase vinte minutos de silêncio que ficou.
‘’Vampiros gostam de fingir que acompanham a modernidade, enquanto os bruxos preferem ser tradicionais‘’ -Ela respondeu enquanto avaliava cores de esmalte que estavam dentro de uma adorável frasqueira da Marilyn Monroe.
‘’Que saco de tradicionalidade‘’ -Eu resmunguei.
‘’Obviamente você tem um gosto diferente porque veio de uma época diferente da maioria de nós‘’ -Ela me analisou - ‘’Certo?‘’
Eu me senti corar, era tão vergonhoso quando descobriam que eu era uma das poucas bruxas que havia nascido no século XXI, isso significava que eu era uma das poucas que não tinha auto-controle.
‘’Certo‘’ -Eu admiti. ‘’Está tão na cara assim?‘’
‘’Tirando o fato de você arrumar as suas roupas manualmente... hum, Não. –Ela riu de deboche.
Seu sorriso se desmanchou segundos depois quando alguém abriu a porta.
‘’Oi garotas‘’-Uma menina extremamente branca de cabelos loiros e olhos cor de mel, magrela e alta igual uma modelo, disse com sua voz fina e penetrante, animadamente. ‘’Eu sou...‘’ - E Aislin fez com ela a mesma coisa que havia feito comigo.
‘’Magdalene?‘’-Completou a bruxa com um suspiro entediado.
‘’Nossa!‘’-Ela ficou boquiaberta. ‘’Isso mesmo, e vocês são...?‘’-Ela era uma garota enérgica e sorridente, totalmente diferente da imagem que eu tinha de vampiros.
‘’Meu nome é Diana‘’ - Eu estendi a mão para cumprimentá-la, com um sorriso no rosto a fim de parecer simpática.
‘’Aislin‘’ -Ela apenas disse o seu nome, não estendeu a mão nem nada, ao invés disso pegou o esmalte cor pêssego e se dirigiu a sua cama para pintar as unhas, Magdalene pareceu não se importar, ela ainda estava sorridente.
‘’Ai meu Deus! Isso é tão legal!‘’- Ela praticamente gritou- ‘’Quer dizer eu sempre quis conviver com bruxos‘’
Aislin revirou os olhos, ela não estava nada contente com a vampira, embora Magdalene fosse fisicamente a mais velha de nos, ela tinha um jeito infantil e escandaloso, que contrastava com o jeito de Aislin que aparentava ser muito madura embora tivesse aquela cara de pirralha.
Depois de praticamente socar meus sapatos e roupas dentro do closet resistindo a vontade de pedir para minha nova colega de quarto vampira ceder um espaço pra mim, eu me deitei na cama para tirar um cochilo, mas Magdalene estava tagarelando como se nos três fossemos melhores amigas, como se ela só estivesse colocando suas antigas colegas de quarto a par da sua temporada de compras em Nova York nas férias, ela era tão aberta.
Um livro arreganhado.
Disse que tinha 150 anos, como ela havia sido escolhida para ser transformada, quem a transformou e mais um monte de informações sobre a sua pessoa.
 Aislin colocou a musica em seu Ipod tão alto que dava pra escutar do outro lado do quarto as batidas de ritmo forte, a situação era tensa e engraçada ao mesmo tempo, já que Magdalene não se importava de ser ignorada por Aislin, ela simplesmente continuava a falar.
  A noite quanto chegou à hora do jantar de apresentação, por algum motivo eu não estava nada excitada para conhecer os meus colegas imortais, mas era obrigatório o comparecimento, e mesmo que não fosse meu estomago já estava roncando. Eu fiz duas trancinhas com as mechas laterais do meu cabelo e prendi atrás, passei um gloss, e eu estava pronta para a apresentação, as minhas duas novas colegas de quarto que disputavam o espelho do centro estavam bem mais produzidas em relação a mim, eu quase me senti desengonçada perto delas, mais então eu me lembrei de um fator importante, elas eram mais velhas. Bem mais velhas. Com o tempo eu também seria graciosa, assim eu esperava pelo menos.

Um comentário:

  1. A história é realmenre interessante. Ainda não apresenta nada de novo em relação ao genero que aborda, mas é interessante. Acredito que quando os anjos caídos aparecerem melhorará ainda mais.
    =D

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