sábado, 1 de janeiro de 2011

Capitulo 5 - Deja vu

  
Ele tinha os cabelos preto ébano estrategicamente desarrumados, seus olhos eram de um azul claríssimo que nenhum humano jamais poderia ter.
O sobretudo nada convencional lhe caia perfeitamente bem.
Deus caprichou particularmente nele, e pelo seu posto se podia deduzir que ele não havia retribuído a proeza.
Eu estava tão ocupada secando o ceifador que nem percebi que a energia explosiva já tinha cessado, e também que tinham nos dispensados.
‘’Eu não acredito que você não tinha nos contado sobre sua família’’-Aislin dirigiu a palavra a mim quando todos estavam esvaziando o salão.
‘’O que tem a família da Diana?’’ - Magdalene perguntou enquanto observava suas unhas perfeitamente manicuradas.
‘’Diana é Neta do Tagore, aquela que nasceu no século XXI... Mas é claro! Como eu não tinha relacionado isso antes? Quantos imortais nasceram neste século?’’ - Ela deu um tapinha na sua testa, e eu não sabia se ela estava brava por eu não ter contado ou por ela não ter descoberto.
‘’Você é da família real? E não compartilha um bafão desses com as amigas?’’- Magdalene fingiu estar perplexa.
‘’As famílias a quais pertencemos tem alguma relevância?’’
‘’Se você pertence à família real, SIM!’’ - Aislin me olhou bicuda, pela primeira vez ela estava agindo como uma criança, bom, a cara ela já tinha.
‘’Me desculpem eu não sabia que era tão importante’’- Eu fingi estar ofendida, e as suas expressões indagadoras suavizaram.
‘’Talvez não seja assim tão importante’’ - Aislin disse por fim. ‘’ Mas de qualquer jeito você poderia ter comentado poxa’’
‘’Quer saber do que mais, vamos seguir o fluxo e esquecer toda essa coisa de família, ceifadores e tudo mais’’ - A vampira começou a empurrar eu e Aislin pra saída - ‘’Eu quero muito tomar um banho e secar meu cabelo ’’

Voltamos para os quartos cochichando, todos pareciam assustados com a situação, e não era pra menos, os nossos hospedes nada mais eram que os nossos inimigos naturais.

‘’Que dia em!’’ - Magdalene voltou do banheiro ainda com a toalha na cabeça.
‘’Nem fale’’ - Aislin estava lendo um livro
‘’Por que exatamente eles estão aqui?’’ - Perguntei
‘’Alguém aprontou’’ - Magdalene respondeu.
‘’Bem, isso é obvio, a questão é o que aprontaram?Nós ficamos um tempão escutando ameaças, mas nem sabemos o porque.’’
‘’Algo a ver com humanos eu acho’’ - Aislin tirou os olhos do livro, de repente ela ficou estranha.
‘’Você sabe de alguma coisa?’’ - Magdalene abriu seu closet
‘’Não.’’ -Ela  respondeu rápido demais. suspeito
‘’Fala logo’’
‘’Bom... É que, eu tive sonhos... ‘’- A bruxa disse distante - ‘’Eu sabia que eles viriam da mesma forma que eu sabia que vocês viriam antes mesmo de vocês chegarem a Elyon’’ - Ela fez uma pausa, e eu me lembrei do meu primeiro dia quando ela já sabia o meu nome e o de Magdalene - ‘’Hoje na cidade aconteceu alguma coisa que acionou os ceifadores, eu não sei o que, mais tive medo que se permanecêssemos lá naquele momento, poderíamos ser de alguma forma relacionadas com o que quer que tenha acontecido, por isso nos saímos de lá às pressas.’’
‘’Bom na cidade você estava realmente estranha, eu achei que fosse parte da sua natureza de bruxa louca’’ - Magdalene brincou
‘’Aquilo foi porque a Diana supostamente estava sentindo a presença deles, o que confirmou o meu mal pressentimento e meus sonhos, só que mesmo assim eu queria acreditar que era coisa da minha cabeça’’
‘’Ou no caso da minha cabeça’’ - Eu disse me lembrando dos dois vampiros e da bruxa me olhando como se eu fosse louca quando perguntei se eles estavam sentindo a mesma coisa que eu.
‘’Eu achei que nós imortais não pudéssemos sentir a presença dos ceifadores’’ - Magdalene disse enquanto desembaraçava seu cabelo louro platinado.
‘’Eu nunca ouvi relatos, mais se a Diana sentiu deve ser possível... Você é uma bruxa Elemental certo?’’- 
Eu assenti -
‘’ E qual seu elemento?’’ - Aislin perguntou.
‘’Boa pergunta’’ - Respondi desanimada.
‘’Você não sabe qual seu elemento?’’ - Aislin perguntou com os olhos arregalados.
‘’Não’’
‘’Tipo assim... O que você faz de diferente? Dependendo do que você faz da pra relacionar com os elementos’’
‘’Tipo assim eu incendeio coisas, explodo coisas, deterioro coisas, resumindo eu destruo as coisas’’
‘’Talvez você seja fogo’’- Magdalene sugeriu incerta.
Eu me esparramei na minha confortável cama e me cobri com o edredom de seda 
‘’É talvez’’ - Eu concordei.
O cansaço estava me tomando aos poucos, a voz de Aislin e Magdalene estava gradativamente ficando longe, eu estava entrando em estado de inconsciência quando um pensamente me trouxe de volta, eu me sentei bruscamente na cama.


‘’O ceifador velho estava na livraria’’ - Eu disse subitamente assustada sem motivo.
‘’Você não fez nada, então não tem nada a temer’’ - Aislin disse com desmazelo e um olhar reconfortante.
‘’Com certeza eles vão ficar no pé de quem foi pra cidade, e isso nos inclui.’’- EU disse aflita
‘’Isso é tão problemático’’ - Magdalene esfregou os olhos e se deitou em sua cama - ‘’Deve ter acontecido uma carnificina de humanos pra ocorrer esse drama todo, e por causa de algum imortal idiota esses anjos rebeldes vão ficar passeando por Elyon’’
‘’Isso é o que eu chamo de ato suicida, provocar a ira dos dois anciões e chamar atenção dos ceifadores‘’- Aislin disse com um sorriso sombrio no rosto.
‘’Há séculos não acontece coisa parecida, esse tumulto todo me parece um pouco dramático’’ - Magdalene insistiu
‘’Eu concordo... Mas vocês sabem, quando se trata de ceifadores eles não perdem tempo, qualquer pretexto pra sair daqui com a alma de alguém’’
‘’Uh, eu acho que nos deveríamos dormir’’ - Eu sugeri incomodada com toda aquela história de imortais problemáticos que atraíram ceifadores que querem levar alma de alguém
- ‘’De qualquer jeito, isso não é problema nosso’’. Não era por que o velho tinha me visto na livraria que ele me relacionaria com o quer que tenha acontecido. 
Certo?
‘’Você esta certa, a melhor coisa a se fazer é ficar fora disso’’ - Aislin fechou o livro e se aninhou debaixo dos lençois.
Segundos depois a luz se apagou sozinha.
Eu já estava me acostumando com aquilo.
Pra quer fazer trabalhos manuais quando se pode usar os poderes?

Nós demoramos um pouco para cair no sono, aposto que assim como eu as duas ficaram pensando nos nossos novos companheiros de internato, é claro que eu estava pensando em um especifico, um que não saia da minha cabeça. Aqueles olhos que escondia uma força interior e ao mesmo tempo passava uma alusão de fragilidade, eles não saiam da minha cabeça.
Qual era meu problema? Eu tinha me sentido atraída por um ceifador? Aquilo era o sintoma para começo de masoquismo?Tive que me esforçar pra lembrar que ele estava ali com a intenção de levar a alma de alguém.
Esforçar-me muito.


 Demorou, mais aos poucos o cansaço entorpecente me envolveu, e eu finalmente apaguei deixando para trás as curiosidades e os problemas do mundo real.

Eu tinha a sensação de estar revivendo uma experiência passada. Aquilo parecia um deja vu...
Quando eu cheguei ao começo do longo corredor com carpete de madeira, tirei meus sapatos para não fazer barulho, encostei minhas costas da parede e comecei a me rastejar estilo 007, eu sabia que aquilo era totalmente desnecessário, mais eu tinha que entrar no clima pra consegui o meu objetivo. Chegar à mesa de carvalho. Eu sabia que quanto chegasse a alguns metros da primeira porta eu teria que me esconder, sabia que a governanta passaria checando o trabalho da serviçal no quarto onde minha irmã Bluma ficaria, ela mais do que ninguém levava a sério aquela coisa de merecer tudo impecável pelo fato de pertencer a uma família real, e bem, também porque prepotência era uma de suas maiores qualidades.
Eu podia escutar o barulho do salto da governanta batendo no carpete, aquele barulho era meu indicador, eu saberia a hora de sair quanto não o escutasse mais. Esperei pacientemente, alguns minutos valiosíssimos que eu estava desperdiçando, ou melhor, que governanta estava me fazendo desperdiçar. Finalmente ela terminara de chegar o quarto, aquela era hora de correr. Eu respirei fundo, eu teria que abandonar o estilo James Bond e correr o Maximo que eu pudesse.
 Sem glamour.
 A mesa de carvalho estava apenas a cinqüenta metros de mim, mais o perigo que eu correria quando passasse aquelas intermináveis portas fizeram com que parecesse muito mais.
Era a hora. Um... Dois... Três!
‘’Diana’’ - Quase saltei pra fora da minha pele quando me deparei com aquela figura a poucos metros de mim.
‘’O que você planeja fazer?'' _Ele perguntou se aproximando _''Por acaso você não pensou que conseguiria, pensou?’’ - 
Eu não respondi nada, aparentemente o meu cérebro havia suspendido suas funções. Eu não lembrava mais como andar, falar, correr... Todas essas coisas que são ridiculamente fáceis e automáticas pareciam dificílimas pra mim.
‘’Muito interessante o jeito que você se locomove... Estranho, mais interessante.’’
‘’O que você esta fazendo aqui?’’ - Foram as únicas palavras que eu consegui dizer.
‘’Eu fiz uma pergunta primeiro’’ - Ele sorriu.
‘’Eu, uh... Eu, na verdade, eu só estava...’’
‘’Diana, você sabe que não pode!’’ - Ele me advertiu.
Droga! Ele sabia
‘’O que você esta fazendo aqui?’’- Refiz a pergunta com firmeza.
‘’Infelizmente isso não é da sua conta’’
Minhas funções cerebrais resolveram aparecer de novo, e eu tive um único impulso.
Correr.
Eu sabia que ele me alcançaria facilmente, e mesmo assim eu me desloquei o mais rápido que pude.
Inútil.
Ele se manifestou na minha frente antes mesmo de eu andar uns três metros.
‘’Eu esperava mais de uma Salonen’’ - Ele sorriu diabolicamente. Aquela era uma coisa que eu já havia escutado inúmeras vezes, e sempre havia me deixado triste saber que eu não estava à altura da minha própria família, mais naquele momento o meu medo era tanto que não teve nenhum efeito sobre mim, mais o medo não era por mim, era pelo que estava atrás da porta perto da mesa do carvalho. Eu temia por cada segundo que eu perdia, um deles poderia ser crucial.
Se eu não poderia correr, qual era minha outra opção?
Pensa Diana. Pensa Diana. Pensa! Só me restava...
Gritar!
O meu grito durou uns três segundos no máximo, porque a minha garganta travou, de repente eu não conseguia gritar e nem respirar.
‘’Decepcionante... ’’ - Ele me olhou com desdém. ‘’Eu realmente esperava que você fosse um obstáculo maior, desse jeito eu não vou nem conseguir me divertir’’ - Mais eu vi que pelo simples fato de me ver sufocar ele já estava se divertindo.
Eu estava agonizando, aquela sensação era horrível, eu estava aos poucos e da forma mais dolorosa perdendo a consciência.
O que me manteve foi o meu objetivo. A porta perto da droga da mesa de carvalho.
Quando percebeu para onde eu estava olhando ele gargalhou, daqueles tipos de gargalhos gostosos que damos quando algo muito engraçado acontece.
‘’Sua motivação é inspiradora... ’’ - Ele se abaixou para ficar com os olhos na altura dos meus e então pegou o meu queixo. ‘’É realmente uma pena que você tenha que morrer... Se tivesse feito as escolhas certas poderia ter uma farta vida imortal, a caçulinha e privilegiada Salonen’’
Forcei-me a dizê-lo um ultimo insulto -  
‘’Vá à merda’’ - Cuspi num sussurro.
Ele apertou minha mandíbula tão forte que achei que fosse quebrá-la, e ao mesmo tempo sua atenção estava voltada aos acontecimentos do quarto que eu necessitava chegar. Ao contrario de mim ele tinha mega-super-audição.
‘’Acabou’’ - Ele disse alguns segundos depois com um sorriso psicopata- ‘’Agora é sua vez’’
Acabou? A palavra veio como um golpe
Como assim acabou? 
Não poderia ter acabado!
Eu senti a energia vital escapar lentamente do meu corpo.
Eu estava morrendo? Eu poderia morrer?
A minha agonia foi substituída por preocupação.
Esmond...
A energia que estava esvaziando de mim voltou abruptamente, a minha dor serviu de motivação para meus poderes, que fizeram as janelas de vidros explodirem, aquilo era o suficiente pra chamar atenção de alguém, mais de repente eu não estava mais tão preocupada com alguém aparecer, não tinha mais sentido. 
Já tinha acabado...

‘’Diana!’’ - Uma voz gritou meu nome
‘’Oh meu Deus!’’ - Eu ouvi alguém choramingar
‘’Diana!’’ - A voz gritou mais alto, eu me senti sendo chacoalhada.
‘’Diana! ACORDA!’’ - 
Eu imediatamente abri os olhos, me deparei com a cabeça de Aislin e Magdalene em cima de mim. 
O alivio por ter sido só um sonho me inundou.
Por mais que eu não tivesse entendido nada, a dor tinha sido tão... real.
‘’O que aconteceu?’’ Eu olhei assustada ao meu redor, o que era pra ser a nossa janela estava espalhado por todos os lados, e o magnífico lustre também.
 Por que eu perguntei quando já sabia a resposta?
‘’Eu estava indo tão bem’’ - Disse decepcionada - ‘’Eu achei que tinha superado essa fase’’
‘’Quer dizer que não é a primeira vez que você explode a janela do seu quarto?’’ - Magdalene perguntou assustada.
‘’Não’’ - Eu admiti envergonhada.
Alguém bateu na porta.
Nós três ficamos imóveis por alguns segundos.
‘’Abram esta porta imediatamente’’ - Era Varditte.
‘’O que vamos fazer?’’ - Magdalene perguntou desesperada
‘’Abrir a porta?’’ - Eu sugeri.
‘’Eu abro’’ - Aislin se dirigiu receosamente em passos curtos até a entrada do quarto, mais não precisou se dar ao trabalho de abrir a porta porque no momento em que chegou ela já estava no chão.
Ótimo! Estávamos sem janela, sem lustre e agora sem porta também.
Nunca na minha vida eu tive tanta vontade de ser uma humana normal, imagina o tanto que a minha vontade se intensificou quando eu vi um ceifador atrás de Varditte, pra ser mais especifica o ceifador atrasado dos lindos olhos azuis.
‘’Vocês conhecem as regras senhoritas, se eu bater na porta vocês tem que abri-la imediatamente’’ -  
Caso contrario ela arromba.
‘’Desculpe senhora’’ - Aislin se fingiu de arrependida educada.
‘’É Foi mal’’ - Magdalene disse mal-humorada.
‘’Que linguajar é esse?’’- Ela repreendeu a vampira. - ‘’Eu não admito esse tipo de comportamento senhorita...-‘’
Varditte parou de passar o sermão em Magdalene quando ela olhou o estado do quarto- 
‘’Pelas barbas de Merlin, o que vocês fizeram com esse aposento?’’- Perguntou sobressaltada.
‘’Na verdade Senhora... ’’ - Eu me levantei e Varditte e o ceifador pareceram notar minha presença pela primeira vez -
‘’Eu explodi sem querer’’- Admiti, talvez não fosse o melhor jeito de explicar o incidente mais era a verdade, e eu me sentia na obrigação de me responsabilizar já que por minha culpa o nosso quarto estava todo ferrado.
‘’Você poderia me explicar como se explode um quarto sem querer?’’ - Ela se aproximou lentamente, e eu me senti igual aquelas mocinhas de filme de terror que são encurraladas pelo serial killer. O olho negro e penetrante daquela bruxa era assustador.
Magdalene e Aislin estavam imóveis apenas observando Varditte me encarar, e o ceifador estava parado perto do lugar que era pra estar uma porta igualmente curioso.
Eu tive que fazer um grande esforço pra esquecer o fato dele estar ali, e também pra esquecer que eu estava com o meu pior pijama. 
‘’Na verdade... Eu...’’ - Aquilo não era bom, eu não agia bem sobre pressão, principalmente sobre o olhar de uma bruxa velha malvada, um ceifador inumanamente lindo e duas amigas com olhares desencorajadores.
‘’Eu estava dormindo e daí eu estava sonhando, e no sonho eu estava triste e explodi umas janelas, só que no sonho as janelas não eram do meu quarto, era de um corredor onde eu estava tentando chegar perto da mesa de carvalho, só que tinha um cara muito mal que não me deixava passar e ele estava me sufocando...’’ - Eu falei tão rapido e sem pausas que quase não me entendi.
Respirei fundo - 
‘’Bom, resumindo, quando eu acordei as janelas e os lustres estavam assim’’
O silêncio reinou pelo quarto por algum tempo, aparentemente todos estavam tentando processar o que eu havia acabado de falar.
Eu pude ouvir risadinhas do lado de fora, pra minha surpresa metade das pessoas da torre sul foi checar o que aconteceu.
‘’Todas vocês voltem imediatamente para seus aposentos’’ - Varditte disse sem nem mesmo se virar. E como sempre sua ordem foi acatada imediatamente.
 Eu já mencionei que as meninas da torre sul não vão com a minha cara?
Primeiro foi o incidente com o espelho do banheiro, agora o lustre e a janela do meu próprio quarto. Talvez eu tivesse arruinado minha vida social em Elyon.
‘’Senhorita Salonen, eu vou lhe fazer uma pergunta e você terá que me dizer a verdade’’- Havia tantas perguntas que eu temia que me perguntassem.
‘’A senhorita é dependente química?’’ - Mais daí ela me vem com uma dessas.
Eu tive que conter o riso.
‘’Definitivamente não senhora’’ - Respondi imediatamente.
Ela me olhou desconfiada.
‘’Muito bem’’ - Ela disse depois de me analisar - ‘’Coloque trajes apropriados e se dirija ao meu escritório’’
‘’Sim senhora’’ - Disse no mesmo tom falsamente respeitoso que a maioria dos imortais a tratavam.
‘’Cinco minutos’’ - Ela ponderou.
Eu já tinha visto senhora Varditte em ação quanto suas ordens desacatadas o suficiente por uma Madrugada, e não queria ver de novo.
Coloquei uma calça e uma blusa de moletom o mais rápido que pude e desci correndo até seu escritório. Não antes de escutar as piadinhas das minhas amigas sobre eu ir pra clinicas religiosas tratar meus problemas com drogas. Eu só não retruquei porque tinha explodido nossa janela.

‘’Entre e sente-se’’ - Uma voz masculina disse quando eu bati na porta.
Varditte não estava ocupando sua poltrona, ela estava no sofá de visitantes, no começo eu não entendi o motivo, mais quando adrentei mais vi que quem estava ocupando o seu lugar era meu avô, ele estava sentado com os cotovelos na mesa e seus dedos cruzados apoiando a cabeça, ele parecia exausto.
A madrugada prometia.
‘’Diana’’ - Meu avô disse meu nome como forma de comprimento como era de seu costume.
Como eu deveria chamá-lo?
Vovô seria engraçado.
‘’Tagore’’ - Disse no mesmo tom e me sentei na frente dele.
Meu avô levantou dois dedos e todos inclusive Varditte, saíram da sala.
‘’Senhora Varditte me informou que você explodiu a janela de seus aposentos’’ - Ele começou- ‘’E que isso foi motivado por um sonho... Gostaria de me explicar essa história direito?’’
‘’Foi isso mesmo’’
‘’Não, não foi Diana’’
‘’Eu não estou mentindo’’
‘’Mas é claro que não, você só se enganou’’ - Ele disse calmamente.
‘’Me enganei?’’ - Eu o olhei curioso -‘’O que aconteceu então?
‘’Aquilo foi um mal entendido, você não sabe absolutamente nada sobre o que aconteceu, você só estava dormindo e quando acordou ficou confusa. Entendeu?’’
Eu o encarei abismada por alguns segundos.
‘’Você quer que eu minta?’’
‘’Pelo seu bem’’
‘’Pelo meu bem? Eu não entendo porque devo mentir, afinal eu não explodi por querer, foi um acidente, todos vão entender’’
‘’Não eles não vão’’-Ele disse no seu típico tom controlado.
‘’Por que isso é tão ruim? Com certeza não foi a primeira vez que aconteceu algo desse tipo em Elyon, quer dizer aqui é um campo de treinamento, coisas assim acontecem a todo momento... Não acontecem?’’
‘’Diana, coopere comigo’’ - Ele passou a mão pelo rosto, o seu cansaço era palpável.
‘’Primeiro me explique. Por que eu tenho que mentir agora? Me explique porque sempre eu tenho que mentir’’
‘’Já disse, pelo seu bem’’- Ele me olhou com aquela cara de confie-em-mim que ele sempre fazia quando não queria me explicar às coisas, aquilo me amoleceu um pouquinho. Só um pouquinho. Por trás daquela cara de ditador malvado ainda estava meu avô. Eu acho.
Nós ficamos nos encarando por alguns segundos.
‘’Tudo bem, eu falo que eu me enganei’’ - Eu suspirei me dando por vencida, quando se tratava de uma conversa com meu avô ele sempre saia ganhando. Mais ainda sim, cada vez mais eu me questionava sobre suas escolhas e planos para mim, acho que esse é o lema de pessoas que tem perguntas sem respostas...
 Se questionar.
 ‘’Embora isso confirme as suspeitas de que eu use drogas’’
‘’Você usa drogas?’’ - Ele perguntou sério
‘’Só um backzinho’’ - Respondi amarga.
 Ele não me conhecia bem o suficiente pra saber que eu não sou disso, nunca fui e nunca vou ser?
Não!
‘’Backzinho?’’ - Ele me olhou confuso - ‘’Do que se trata?’’
 Eu tive que rir, Tagore Salonen o bruxo que tinha séculos de vida não sabia o que era um back.
‘’É um tipo de droga’’ - Respondi rindo - ‘’O mais importante é que eu não uso’’
‘’Isso é reconfortante, por que seria inadmissível ter uma viciada na linhagem por toda eternidade’’ - Ele disse sério
‘’É eu imagino’’- Eu engoli seco
Ficou um silêncio desconfortável entre nos, isso acontecia com muita freqüência na minha família, quando se tratava de negócios, castigos e rigidez todos tinham muita coisa o que falar, agora quando o assunto era uma simples conversa entre parentes as coisas ficavam estranhas.
‘’Então... Eu posso ir?’’
‘’Sim, você pode retornar aos seus aposentos, desde que tenha captado bem o recado’’
‘’Eu captei’’
‘’Sendo assim’’ - Ele dirigiu o olhar para a porta. Aquela era sua forma sutil de dispensar as pessoas.
***

Aquela madrugada estava particularmente fria, o meu moletom não estava ajudando muito, o caminho até a torre sul parecia longo, só depois de sair do escritório eu pude perceber o quando eu estava mentalmente e fisicamente cansada, havia tantas coisas borbulhando na minha cabeça, eu queria saber o porquê da visita dos ceifadores, porque eu destruía as coisas sem querer de vez em quando, porque o meu sonho parecia mais uma lembrança do que um sonho, por que diabos eu me sentia estática na presença daquele ceifador, e o mais importante quem era Esmond? 
Pensar em perguntas sem respostas me deixou agitada, eu precisava relaxar. Mas como?
Perfeito! Eu pensei quando vi um banco convidativo a alguns metros de mim, eu nunca gostei de ficar no escuro sem fazer nada, mais de repente a idéia de sentar no banco sob a luz do luar e observar o mar de madrugada me pareceu uma boa idéia. Aquele era um bom momento para meditar.


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